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quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Além do fim da farra

Um dos principais marcos da modernização da gestão pública brasileira, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) comemora uma década em 2010. Ao limitar endividamento e gasto com pessoal, determinando sanções – inclusive penais – aos governantes incapazes de controlar os instintos primitivos da gastança, deu continuidade ao processo iniciado com a estabilização da moeda, através do Plano Real.
É certo que seu caráter punitivo não necessariamente coloca miolos nas cabeças dos políticos para que melhorem a qualidade dos gastos públicos e tampouco lhes empresta vergonha na cara para cumprirem promessas eleitorais. De qualquer forma, o fortalecimento das instituições se dá com tijolo por tijolo.
É verdade que a conta dos impostos ainda é desproporcional ao serviço prestado, mas ao menos já há a garantia de que nem só de bons modos depende o contribuinte – isso quando o assunto são os governos municipais e estaduais, pois a es(tratos)fera federal ainda permanece órfã da regulamentação, apesar de prevista na lei.
Desde a “Carta aos Brasileiros”, em que o PT pragmático se comprometeu com ajuste fiscal, câmbio flutuante, metas de inflação e essas barbaridades aos olhos da ala fundamentalista, o presidente Lula se dispôs não apenas a rezar a cartilha de Duda Mendonça, mas também a da estabilidade econômica.
Hoje na função de anfitrião da festa, em parte redimido do passado de pregação anti-qualquer coisa, proposta ou idéia de autoria dos “neoliberais” comandados pelo sociólogo FHC, tem a chance de se desculpar perante a nação pelo voto contrário à LRF da tropa petista no congresso: todos os 86 deputados e 8 senadores da época – não satisfeitos com a derrota parlamentar, ainda tentaram, sem sucesso, o tapetão judicial.
Mais do que pedir desculpas, poderia estar definitivamente perdoado se buscasse regulamentar a lei em nível federal e diminuísse o apadrinhamento populista, disciplinasse o bolsa família e promovesse as reformas estruturais de que o país precisa e sem as quais é mero jogo de cena se intitular social-democrata.
Difícil imaginar tamanha correção de rumo do governo sem contar na oposição com gente como o governador Mario Covas, pai moral do equilíbrio das contas públicas, antes mesmo de compor a letra da lei. Herdeiro da massa falida do Estado de São Paulo após governos de Quércia, Fleury e Maluf, a antítese da responsabilidade fiscal, política e tudo mais, suou para recuperar o vigor econômico do maior recolhedor de impostos da federação.
Que a festa, mais do que comemorar o fim da farra, signifique compartilhar com a sociedade a importância da racionalidade na gestão pública tanto quanto ela importa nas empresas e na família, assentando o alicerce para os próximos tijolos.

Artigo publicado no Jornal da Cidade, no dia 27/01/09.